16
Nov08
Cinema ao domingo
sp
Para os meus pais, o domingo é e será sempre o dia para estar com a família, e como tal, hoje fui visitar os meus avós paternos á aldeia. Se o dia foi da família, a noite foi planeada com os amigos. Combinei com o meu grupo de amigas ir ao cinema. Estava envolvida e entusiasmada com a história misteriosa que o filme continha, quando o meu telemóvel começou a vibrar. Era uma mensagem do meu irmão, que numa escrita meia atrapalhada me dizia para ir rapidamente para casa. Fiquei seriamente preocupada, o que se teria passado? Saí discretamente. A noite estava fria e solitária. Caminhava apressadamente pelo passeio, apenas o canto melancólico das árvores me fazia companhia. Cheguei a casa. A porta estava entreaberta, as chaves do meu irmão estavam caídas no chão, as luzes estavam silenciosamente apagadas. Um turbilhão de perguntas invadiu o meu interior a uma velocidade estranhamente vertiginosa. Onde estaria ele? Estaria a sentir-se mal e foi pedir ajuda? Algum ladrão tentou assaltar a nossa casa? Porque estava a porta aberta? E os meus pais, onde estavam? O medo apoderou-se de mim, não sabia se devia entrar, ou ir pedir ajuda. Entrei. Fui caminhando até á cozinha. Acendi as luzes. Tudo estava normal, não estava nada arrombado, nem fora do lugar. Sentei-me no sofá, perto da lareira. O silêncio imperava de forma assustadora. Quando de repente, o relógio da sala tocou, assinalando as 11 horas da noite, as luzes apagaram-se, e um ouvi grito arrepiante, sufocante, estridente e perturbador, que vinha de um dos quartos. Pareceu-me familiar…era… era o meu irmão, ele precisava de ajuda. Estava completamente em pânico, mas não podia ficar ali, tinha de fazer alguma coisa, algo se passava. No meio da escuridão, levantei-me, e tentei alcançar através de apalpadelas uma frigideira. Consegui encontra-la, e segurei-a bem na minha mão direita. Fui percorrendo o corredor muito lentamente, apenas sentia o bater do meu coração, que gritava assustado. Nunca antes aquele corredor me parecera tão grande, parecia que a cada passo que dava recuava dois. Senti passos. Passos que vinham de alguém que caminhava atrás de mim. Parei, e senti uma mão pesada pousar sobre o meu ombro esquerdo. Fiquei imóvel, inerte, sem reacção e um frio gelidamente inefável e cortante apoderou-se do meu corpo percorrendo-o á velocidade da luz. Mas, sem tempo para pensar, e instintivamente, girei num movimento incrivelmente rápido e acertei-lhe em cheio na cabeça com a frigideira. Senti um alívio arrepiante quando percebi que ele estava caído no chão.
- David, onde estás, ele já não te faz mal. – disse eu para o meu irmão.
As luzes acenderam-se, o meu irmão apareceu á minha frente envolto de sonantes gargalhadas de gozo. Fiquei atarantada, afinal o que se passava ali. Primeiro tinha soltado um grito que pedia ajuda, e agora ria-se á brava. Num gesto lento, olhei para trás, as feições da face do sujeito que estava deitado no chão não me eram estranhas. Aproximei-me mais, e, não, não podia ser, era o Jorge, o amigo do meu irmão, com quem eu tinha uma relação muito especial, há algum tempo. Tentei ajuda-lo, passei-lhe água pela cara, e ele começou a abrir os olhos estremunhado. Fixou os meus olhos, e ainda atordoado, disse:
- Esta é a forma carinhosa que tu tens de receber os teus amigos??
O meu irmão não parava de rir, e então percebi tudo. O Jorge vinha visitar-me e queria surpreender-me, não daquela maneira, mas o meu irmão fez o favor de dar o seu toque mais emotivo e assustador á surpresa, envolvendo-nos numa cena dos seus filmes.
(história ficticia para a Fabrica de Histórias)